Como se identificam e se detectam raios gama e raios X?
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RAIOS X E RAIOS GAMA
Os raios gama são ondas eletromagnéticas de alta energia provenientes do decaimento de um núcleo num estado excitado para um estado de energia menor, que pode ser em particular o estado fundamental. Os raios X também são ondas eletromagnéticas, mas são emitidas por átomos em estados excitados de energia, gerando um espectro discreto de energia, ou então, durante o processo de desaceleração de um elétron energético dentro de algum material, resultando num espectro contínuo de energia.
O átomo pode ganhar energia por algum mecanismo, por exemplo, através de colisões com elétrons e fica num estado excitado. Esse átomo não permanece muito tempo nesse estado excitado, prontamente decai para um estado de energia menor e a energia excedente é emitida como radiação, que é o raio X. Segundo o modelo de Bohr do átomo, existem níveis possíveis e discretos de energia (esses níveis estão relacionados ao que os químicos chamam de camada K, L etc.) para os elétrons ocuparem. Desde que os elétrons estejam ocupando um desses níveis, não há emissão de radiação como se esperaria pela teoria clássica. Um elétron numa órbita de Bohr não emite energia e está num estado estável. O elétron pode passar de um nível de energia para outro nível possível e desocupado de energia mais alta e, nesse caso, diz-se que o átomo está num estado excitado. Logo haverá a desexcitação do átomo com o elétron indo para um nível mais baixo e desocupado de energia, ocorrendo a emissão do excedente de energia na forma de um raio X, ou de luz, ou de energia térmica (onda infra-vermelha) de acordo com a ordem de grandeza da energia. São emissões de energia eletromagnética com diferentes comprimentos de onda. Cada átomo tem uma estrutura tal que haverá uma distribuição dos níveis possíveis de energia, que é sua característica. Os níveis de energia do átomo de hidrogênio são bem conhecidos. Outros átomos têm também cada qual a sua distribuição de níveis quânticos de energia. Por exemplo, se as energias envolvidas na desexcitação do átomo forem baixas haverá emissão de luz visível num espectro discreto também característico; é o que se observa na série de Balmer do átomo de hidrogênio. Pode-se identificar um átomo através do seu espectro de emissão de raias de energia usando um simples espectroscópio. Este é o espectro discreto de energia.
Os raios X podem também ser emitidos quando elétrons são freados dentro de determinados materiais, é o chamado Bremsstrahlung, ou radiação de freiamento (do alemão: bremsen frear, Strahlung radiação) Nesse caso a energia máxima dos raios X depende da energia do elétron, e, junto com a radiação de freiamento aparecem também os raios X característicos do material onde está sendo freiado o elétron. Numa ampola de raios X, um elétron do catodo (filamento quente) é acelerado através de uma diferença de potencial V e ganha energia qV (a energia ganha pelo elétron ao atravessar uma diferença de potencial V é dada pelo produto da sua carga q pela diferença de potencial). O elétron de energia qV , medida em eletron-volt, entra no material do anodo da ampola de raios X e perde energia, desacelera e emite raios X com um espectro contínuo de energia.

O espectro de raio X normalmente observado é a sobreposição do espectro contínuo de Bremsstrahlung com o espectro característico de um material, conforme é mostrado na figura abaixo. A distribuição dos níveis de energia dos elétrons de cada átomo é uma característica desse átomo. Dessa forma medindo a energia de um raio X emitido pode-se identificar o átomo que o emitiu, daí o nome raio X característico.
Moseley, conhecido em aulas de química, pelas contribuições à construção da tabela periódica também trabalhou com Rutherford, no início de sua curta carreira científica. Ele morreu com apenas 27 anos em combate na expedição inglesa em Dardanelles, em 1915. Ainda antes da guerra havia mostrado um método simples de medir a carga nuclear Z, o número atômico do átomo, através de seu estudo sistemático com raios X: o diagrama de Moseley de raios X.
- Figura 3: Diagrama de Moseley, na ordenada, Moseley representou a raiz quadrada da freqüência dos raios X característicos emitidos por um átomo e na abcissa, o número atômico. Ele obteve uma reta para os raios X da linha Kα e outra para os da linha Kβ. O mesmo tipo de comportamento é verificado também para as linhas L (K e L se referem às camadas eletrônicas). Dessa forma, foram observadas falhas visíveis no diagrama, correspondentes a elementos descobertos em seguida por diferentes cientistas. Moseley imediatamente relacionou seus resultados com o modelo de Bohr e o espectro do átomo de hidrogênio. (“From X rays to quarks”- Emilio Segré, pág.134, 135, reedição 2007 Dover).Esse comportamento propiciou a identificação de alguns novos elementos. Até então a identificação de elementos era feito por métodos químicos relatados, por exemplo, nas referências ao trabalho de Mme. Curie.
Raios γ
Os raios X são ondas eletromagnéticas de energia maior que ondas de rádio e ondas luminosas visíveis, que por sua vez são de energia maior que ondas infravermelhas correspondentes ao calor. Existem ainda os raios gama, que também são ondas eletromagnéticas, mas são provenientes da desexcitação de um núcleo atômico e tem, em geral, energias maiores que os raios X. Alguns núcleos emitem raios gama em seqüência à emissão de partículas alfa ou beta. Os raios gama têm energias características dos núcleos emissores dessa radiação. A seguir estão representados os esquemas de decaimento do 210Po, que decai com 100% de probabilidade para o estado fundamental do 206Pb pela emissão de um raio alfa de 5,4075 MeV. Já o 60Co decai com 99,92% de probabilidade para o estado excitado do 60Ni, de energia 2,5058 MeV, que decai para o estado excitado de 1,3325 MeV. Costuma se dizer que a fonte de cobalto 60 emite um raio beta de 0,3178 MeV e deixa o núcleo de 60Ni num estado excitado, gerando os dois raios gama em cascata de 1,1733 MeV e 1,3325 MeV. Notem que as duas outras possíveis formas de decaimento do 60Co por emissão beta tem probabilidades muito baixas: de 0,02% e de 0,06%. As meias vidas também estão indicadas: notem que a meia vida do 210Po é de 138,376 dias e a do 60Co é de 5,2714 anos. Embora o emissor de raios γ seja na verdade o 60Ni costuma se chamar essa fonte radioativa de fonte de cobalto. Os spins de cada estado estão indicados do lado esquerdo e acima da linha que o representa. Segundo a convenção mais recente de representação de um núcleo o número de massa de um núcleo deve ser colocado à esquerda e acima do símbolo químico e quando se quer representar também o número atômico ele deve ser colocado à esquerda e abaixo do símbolo químico e não como está na figura.

Os raios gama tem energias maiores, desde alguns keV até alguns MeV (keV= 103 eV e MeV=106eV) . A absorção de raios γ também segue a lei exponencial, que é válida para todas as ondas eletromagnéticas, como os raios X como descritos a seguir. Também no caso de raios γ usa-se chumbo como absorvedor ou “blindador” eficiente.
Absorção de raios X
Os raios X tem energia desde alguns eV até keV(eV é a energia ganha por um elétron de carga e ao atravessar uma diferença de potencial de 1volt). Por terem energia baixa eles interagem preferencialmente por efeito fotoelétrico. Suponha um feixe de raio X incidindo sobre algum material. Um fóton de raio X, ao atingir um átomo desse material, dá toda a sua energia a um elétron ligado desse átomo, o elétron sai deixando o átomo num estado excitado. Mas um fóton de raio X saiu do feixe inicial. A probabilidade de ocorrer efeito fotoelétrico depende como já foi dito da energia do fóton incidente, mas depende também da densidade de material e muito fortemente do seu número atômico. Quanto maior a densidade e quanto maior o número atômico do material maior é a probabilidade de interação com o raio X. Assim, quando um feixe de raios X atinge um objeto de alto número atômico alguns fótons não conseguem atravessá-lo, dependendo da espessura apresentada, o que justifica o uso de placas de chumbo como atenuadores do feixe de raios X. A lei de absorção de raios X e de raios gama (também onda eletromagnética só que emitida pelo núcleo atômico e de energia maior que a dos raios X) é uma lei exponencial:
onde I é a intensidade depois de atravessar a espessura x de um material cujo coeficiente de absorção é μ e Io é a intensidade inicial do feixe incidente. Em princípio, como a intensidade de raios X cai exponencialmente, é necessário ter x (espessura) infinita para a intensidade ir à zero. A intensidade que consegue atravessar um material depende de quanto o material consegue interagir, isto é, do seu coeficiente de absorção μ, que por sua vez depende do número atômico e da densidade do material absorvedor. Na prática, a blindagem dos raios X ocorre quando a espessura do absorvedor é tal que a intensidade observada não difere das contagens de fundo, pois raios cósmicos e fontes naturais de radioatividade sempre estão presentes nos ambientes. Por exemplo, há muitos fótons de raios gama provenientes de 40K presente na cal e, portanto, em todas as estruturas que tenham cimento. É muito comum vermos operadores de raios X com aventais de chumbo de espessura de alguns milímetros e que cobrem praticamente todo o corpo, o que é suficiente para protegê-lo da radiação. Ou então, eles se protegem atrás de espessas paredes. Dado o atual desenvolvimento tecnológico utilizado para diagnóstico odontológico das pessoas e para a prevenção ou tratamento de saúde os mais variados, é necessário conhecer e se prevenir quanto aos níveis adequados de radiação que uma pessoa pode tomar sem que haja danos à sua saúde. Observação:Na atividade proposta com as radiografias, para interpretar corretamente as imagens, é necessário identificar a que objeto a radiografia corresponde, por exemplo: uma peça metálica, um cachorro, uma parte de um corpo humano. Em geral, se tratam de radiografias do corpo humano, com ossos e carne, órgãos, etc. Devemos comparar a imagem dos ossos com a de outros tecidos identificados, e, também estimar a composição e as espessuras de cada parte, para interpretar corretamente as radiografias. Como descrito acima, quanto maior o número atômico e a densidade do material, maior a probabilidade de haver espalhamento dos raios X do feixe inicial. Se o raio X é absorvido ou desviado, esse fóton obviamente não irá sensibilizar a chapa da radiografia. Regiões que recebem bastantes raios X ficam veladas. Os raios gama tem energias maiores que os raios X, desde alguns keV até alguns MeV (keV= 103 eV e MeV=106eV) . A absorção de raios γ também segue a lei exponencial, que é válida para todas as ondas eletromagnéticas. Também no caso de raios γ usa-se chumbo como absorvedor ou “blindador” eficiente.
Atenuação de raios gama
Enquanto os raios X interagem por efeito foto-elétrico, por causa da sua baixa energia, os raios gama interagem segundo os três principais modos: efeito foto-elétrico, efeito Compton e produção de pares.
Efeito fotoelétrico: No efeito foto-elétrico um fóton de energia hν incide sobre um átomo e arranca um elétron ligado pela energia de ligação El . O elétron sai então com energia cinética hν - El. Como em geral a energia de ligação do elétron é bem menor que a energia do fóton incidente, costuma se dizer que no efeito foto-elétrico o fóton transfere “toda” a sua energia ao elétron ligado ao átomo. Pode se mostrar que para dar conta da conservação de energia e de momentum, no efeito foto-elétrico são arrancados elétrons de camadas bem internas, isto é, bem ligados, o que causa o recuo do núcleo quando o elétron é emitido.
Efeito Compton: No efeito Compton um fóton de energia hν dá parte da sua energia para um elétron quase livre (de camadas bem externas do átomo ou elétrons livres) e sai outro fóton de energia menor hν´. O elétron sai com energia cinética que depende do ângulo em relação à direção de incidência do primeiro fóton e do ângulo de saída do segundo fóton. Deve haver conservação de energia e de quantidade de movimento. Há assim uma distribuição de energia desde zero até quase a energia total do fóton incidente.
Produção de pares: Se o fóton tiver energia maior que a massa de dois elétrons, isto é, se for maior que 1.02 MeV, poderá haver produção de pares elétron pósitron. Nesse caso a energia cinética do elétron e do pósitron será dada pela metade da diferença entre hν e 1.02 MeV.
Os elétrons formados então por um desses três modos podem ser usados na detecção do raio γ, isto é, as ionizações causadas pelos elétrons são usadas para gerar cargas que serão coletadas e analisadas eletronicamente a fim de sistematicamente obter as energias correspondentes a cada emissão γ ou de raio X. A cada interação com os átomos do material absorvedor um fóton de raio X ou de raio γ é retirado da direção inicial; assim, a diminuição do número de fótons desses feixes segue indefinidamente, como pode ser deduzido facilmente. A diminuição do número de fótons é dada pela relação:
Onde o sinal negativo representa a diminuição do número de fótons. Pode-se entender que o número de fótons, - dN, retirado do feixe inicial depende do produto mostrado acima, pois depende diretamente de cada um dos fatores. N é o número de fótons incidentes. O coeficiente μ depende da energia do fóton e do material absorvedor; dx é a espessura elementar atravessada pelo feixe de gamas. Conforme vai aumentando a espessura x do absorvedor, a relação exponencial negativa indica a diminuição da intensidade, isto é, a diminuição do número de fótons:
onde N0 é a intensidade inicial.
Então a diferença fundamental é que sendo a relação entre as contagens e a espessura do absorvedor uma exponencial, esse número nunca vai a zero. Entretanto ocorre que para espessuras de absorvedor acima de um determinado valor a intensidade detectada se confundirá com as contagens de fundo, isto é as contagens que existem nesse lugar sem a presença de fontes radioativas. Esse limite é a radiação de fundo e é o que chamamos de “background”, ou contagens de fundo. Uma das radiações de fundo provém das radiações cósmicas. Mas, em construções é muito forte a radiação de 40K, que são gamas de 1,46 MeV e tem também betas de baixa energia. O potássio é um elemento presente na massa das construções.
Abaixo estão os gráficos que mostram as secções de choque (eixo vertical) para as diversas formas de interação dos raios gama: efeito foto elétrico, efeito Compton e produção de pares, em função da energia em MeV (eixo horizontal) para chumbo, água e ar. Figuras relativas a outros materiais podem ser vistos na mesma fonte, Evans, cap.25. A secção de choque traduz a possibilidade de interação dada uma quantidade de matéria e é medida em unidade de área por grama da matéria, como indicado no eixo vertical dos gráficos. Obviamente, quanto maior a quantidade de matéria presente para o choque maior será o número de eventos. No eixo horizontal está representada a energia do raio gama. Note que a escala é logarítmica nos dois eixos o que permite representar um grande intervalo de valores. Cada “década” corresponde a uma ordem de grandeza. Note que no eixo horizontal a energia varia de 0,01 MeV a 100 MeV. Dessa forma as secções de choque para raios X também estão representadas de 10 keV a 100 keV, que valem obviamente para raios gama também.
Notem também como as secções de choque são bem maiores para o chumbo comparado com água e ar. Por essa razão a penetração de raios X e de raios gama pode ser evitada com a presença de paredes e lâminas de chumbo. A perda de energia de partículas carregadas se dá por outro mecanismo que de ondas eletromagnéticas, a perda se dá por ionização e excitação.
Como foi visto, as partículas γ interagem com a matéria por três diferentes processos: o efeito foto elétrico, o efeito Compton e a produção de pares. Esses modos de interação são as bases de um método muito utilizado para a detecção dessas partículas usando cintiladores acoplados a fotomultiplicadoras e circuitos eletrônicos apropriados, especialmente projetados para esse fim. A energia do raio gama pode ser muito bem determinada com esses detectores.
Observação: Em geral costuma se usar o termo absorção para raios X, que interagem preferencialmente por efeito foto elétrico e o fóton desaparece do feixe inicial. No caso de raios gama, como pode haver ainda depois da interação outro raio gama, costuma-se usar o termo atenuação, embora em parte ocorra também a absorção completa da energia do fóton inicial. Costuma-se classificar produtos radioativos como destrutivos e poluidores do meio ambiente, mas existem inúmeros usos não destrutivos da radiação gama, por exemplo, em medicina nuclear. Pode haver até alguma destruição, mas com conseqüências positivas.
Outra utilidade não destrutiva da radiação gama é o uso da gamagrafia para testes não destrutivos de materiais pesados e volumosos. Esta técnica baseia-se na propriedade de absorção diferente de raios gama ao incidirem em materiais diferentes. Raios X, por ter energia menor, só podem ser usados em testes não destrutivos de pequenas quantidades de material ou de materiais com número atômico baixos, mas suficientemente finos.